Minha mudança para a Alemanha deu-se menos de um ano depois de nos conhecermos. Nós
morávamos em um apartamento de quarto, sala, cozinha e banheiro. Não
havia varanda ou terraço. Extremamente desconfortável, levando-se
em consideração que havia dois velhos aquecedores à gás, que não
esquentavam o suficiente para suportar o frio do inverno. Logo nos
primeiros dias ele me presenteou com uma linda aliança, mas não a
pôs em um determinado dedo, apenas me deu e quando eu perguntei onde
deveria usar, ele disse que eu usasse onde quisesse. Posteriormente,
a aliança não significou nenhum compromisso.
Em vez de jantares,
passeios e festas(como muitas pessoas enganosa mente pensam!), o que me aguardavam eram jantares econômicos,
feitos em casa mesmo, e com ingredientes comprados na seção de
promoção do supermercado, de produtos com validade de consumo
prestes à vencer (''hoje sei que isso é muito comum, e não
significa que os produtos estão estragados, mas que o consumo deve
ser em curto prazo); passeios de bicicleta; idas à sauna e
programas de televisão que eu não entendia, por não falar alemão.
Aquilo foi um choque para mim, que nunca havia vivenciado tal
situação. Para piorar, Albert só assistia televisão no
quarto e ficava até altas horas da madrugada com o aparelho ligado,
e muitas das vezes até adormecia assim, e para mim era um grande
tormento, pois estava habituada a dormir na total escuridão e em
silêncio. Em minha casa no Brasil eu não tinha televisão no
quarto. Algumas vezes pedia para o Albert baixar o volume ou até
mesmo desligar, mas ele normalmente não atendia às minhas
solicitações, e começava então mais uma discussão. Eu pensava
comigo mesma, que se ele tinha os seus costumes e manias de homem
solteiro ou que vivia sozinho, porque então procurar uma mulher, se ele não a
respeitava? Fui dormir no sofá na sala...mas nem isso o abalou!
Não havia feito planos ou me enganado, no sentido de ter buscado um homem rico que me tratasse como a princesa de um conto de fadas. Sempre acreditei no caráter das pessoas, e na união de dois seres por amor, ou pelo sentimento comum que leva duas pessoas a quererem estar juntas. Algumas vivências pessoais me fizeram crescer, amadurecer e me tornar uma mulher adulta com os pés no chão, o que não me torna menos sensível ou incapaz de me enganar em minhas escolhas. O mais importante de tudo isso, é que sempre fui capaz de assumir minhas responsabilidades diante do preço pago nas consequências trazidas por essas escolhas!
Quando
ainda estávamos no Brasil, o Albert havia me prometido
espontaneamente, que não manteria mais contato com garotas pela
internet, que nossa vida seria de harmonia e de muito amor, o que
também não aconteceu, pois uma vez, ele havia saído e deixado o
seu computador ligado, e então lí um diálogo que mantinha com uma
mulher em uma sala de relacionamentos da internet, e perguntando se
não tinha fotos bonitas para lhe enviar. Ali acabou minha confiança
nele . Passei a observá-lo através de um quadro, o qual o vidro
espelhava exatamente o lugar na sala, onde ele sentava ao computador.
E para ver sua reação, falava com ele como se estivesse me dirigindo
à sala, mas permanecia no mesmo lugar, apenas para ver se estava
certa nas minhas desconfianças, e então via quando ele rapidamente
mudava a tela do computador e olhava desconfiado sobre o ombro, para
ter certeza de que eu não tinha visto...Era muito triste, pois
aquele não era o meu comportamento natural. Crescí acreditando
nas pessoas. Acreditando no respeito que duas pessoas que se querem
devem nutrir uma pela outra...e parecia que aquele não era o
caso...Enfim...passei a acreditar em todos os pressentimentos ruins
que tive, antes de viajar pra Alemanha.
Em uma de nossas conversas na internet, ele falou que havia me
comprado roupas de segunda-mão, a pesar de eu lhe dizer meio sem
graça que não precisava, pois não gostava de vestir roupas que eu
mesma não tivesse escolhido, pra não dizer que nunca havia usado ou
comprado roupas assim. (Esse é um costume ainda muito praticado na
Alemanha, e acredito que em muitas outras partes da Europa, que são os chamados "Secondhand" - Lojas de Segunda Mao, como os brechós no Brasil por exemplo. Principalmente as mães, compram para as suas crianças. Essa é uma forma de economizar, levando-se em conta que existem
lojas que oferecem roupas em muito bom estado de conservação, por muito bons preços. Talvez eu não tivesse esse problema se conhecesse essa cultura. ) Tudo em vão,
pois ele já havia comprado.
Ao chegar à casa dele, fiquei chocada quando ele me mostrou as coisas que me havia comprado. Modelos tão fora de moda que jamais poderia vestí-los. Era muito vaidosa para isso.
Com o passar do tempo, eu pude observar que havia caído em uma armadilha e, por estar tão desorientada com tudo o que estava vivendo, com tantas omissões e mentiras, não via uma saída ou uma oportunidade para consertar o grande “erro” cometido.
Algum tempo depois sentí
uma grande decepção, pois tudo o que ele havia me falado e escrito
quando nos conhecemos, quase nada era verdade. Ele havia me falado
que era um esportista, que viajava três vezes ao ano para a
Austrália para praticar vôos de parapente; que nadava algumas vezes
por semana em uma piscina olímpica no centro esportivo próximo à
sua residência. Tudo mentira.
Descobrí que o Albert era desempregado, e que era sustentado pelo Estado havia anos. Ele me havia falado no Brasil ainda, que nunca havia feito uma faculdade e nem sequer tinha uma profissão, mas trabalhava com computadores e tinha sua estabilidade financeira, mas enfim, eu não pensei que fosse tão importante, que o que importava era ser feliz com Albert, já que mostrou-se aparentemente ser uma pessoa séria e havia viajado milhas para me conhecer, pelo menos era o que eu pensava.
Quando nos conhecemos,
eu estava vivendo uma fase de introspecção, não queria namorar
naquele momento, apenas curtir a minha vida de solteira, meu trabalho, e viver para
mim. Já havia me magoado demais com romances e namoros que não
deram certo, mas ele me conquistou de uma forma tão diferente que
pensei em me dar uma chance.
Na Alemanha, não demorou muito, até
que eu observei que havia algo de estranho em Albert, pois ele também
não esperou muito tempo para me mostrar a sua verdadeira face. Em uma ocasião, ele
fez questão de me ensinar, como ele limpava o apartamento, como
cozinhava (até a forma como eu cortava a cebola ele me criticava!), como lavava os pratos e etc, e que eu deveria fazer como
ele me mostrara. Uma vez, eu havia terminado de limpar os móveis,
que eram escuros e que devido aos velhos aquecedores liberarem muita
poeira, a sujeira ficava então muito visível. Ele aproximou-se e
passou o dedo para verificar se estavam bem limpos, o que eu
simplesmente achei um absurdo, mas como sempre fui tranquila e não
queria escândalos, apenas perguntei o que ele pretendia com aquilo,
pois eu não era sua faxineira e sim sua namorada. Mas não obtive
nenhuma resposta convincente, e a partir dali deixei que limpasse ele
mesmo.
Com o passar do tempo as
brigas ficaram mais sérias, faltando apenas chegarem às vias de
fato. Eu havia sido bastante tolerante, não queria acreditar que as
coisas não iriam melhorar, tinha esperanças, mas aos poucos via que
a situação entre nós só tendia a piorar. Albert não me dava
atenção e só tinha tempo para conversar com novas amigas na
internet. Além de estar envolvido na busca de um novo trabalho, o
que de fato aconteceu.
Persistente como era, eu não queria desistir de tentar, de contornar
aquela situação. Algumas vezes, achava que eu mesma talvez fosse
injusta e que talvez fosse minha culpa as discussões que se sucediam
entre nós. Albert dizia que eu sempre tinha um argumento, e ele me
criticava dizendo que eu sempre queria ter a palavra final. Eu não
aceitava essas críticas, pois sabia que era inteligente e isso era o
que me levava a sempre ter um argumento, e rebater suas críticas,
que eram sempre negativas e mexiam com minha autoestima.
Sempre
fui uma pessoa determinada e seguia estudando o idioma alemão em
casa, a pesar de ter muita dificuldade, e mesmo me comunicando com
meu namorado apenas em espanhol. Logo que eu cheguei à Alemanha, em
minha primeira viagem ao país, Albert me matriculou em um curso
básico de alemão para principiantes, o que foi de grande proveito
para mim. Mas não foi o suficiente pra me comunicar e ser entendida
com clareza, pois como nós só falávamos em espanhol, não haveria
chance de aprender a falar o idioma. Às vezes, sentia-me insegura, por
não ter o suporte que precisava em casa, sendo assim, continuei
sem saber falar.
A
nossa convivência, a vida a dois, era algo que estava fadado ao
fracasso. Durante minha permanência na Alemanha, em minha primeira
viagem, os dias foram apenas de desentendimentos. Era como se
houvesse algum tipo de concorrência entre nós, que eu não podia
compreender. Albert vivia criticando o Brasil, falando mal das coisas
que ele não conhecia pessoalmente, apenas teoricamente ou de ouvir
falar. Minha intenção era viver uma vida de paz e harmonia.
Constituir uma família, ter filhos, trabalhar, me integrar ao país
que escolhí para viver. Mas meus sonhos estavam sendo destruídos,
por alguém que invadiu minha vida com uma promessa mentirosa e
egoísta.
segue...
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